– Chega, mãe. Não vou voltar mais lá para a fábrica. Acabou – disse o jovem insatisfeito durante o almoço que fazia em casa todos os dias.
O trabalho na fábrica não era fácil, ainda mais trabalhando com soldas numa linha de produção monótona.
– Mas esse outro trabalho está certo? Vão te pagar?
– Sim, já assinei o contrato para fazer uma turnê na Alemanha com essa banda.
– E depois?
– Deve ter outros shows pela Europa e assim posso seguir carreira como músico profissional tocando guitarra. A fábrica não é futuro para ninguém, né?
– Mas pelo menos você tem um salário garantido.
– Mãe, já falamos sobre isso e para mim chega. Não quero mais saber disso.
– Filho, então pelo menos cumpra o seu contrato e encerre o expediente ao final do dia. Não desapareça do nada. Volte lá e seja profissional, ok?
– Ok, mãe.
Contrariado, ele voltou para a fábrica para cumprir o turno da tarde e pedir demissão, mas ao chegar lá teve uma surpresa.
Um dos funcionários que fazia o corte dos metais, antes de passar para ele fazer as soldas, não voltou e o chefe, então, pediu que ele fizesse esse trabalho também.
Ele começou a fazer e, numa fração de segundos, ao manusear a prensa mecânica, sentiu uma dor insuportável, viu o sangue escorrendo pela esteira e então percebeu que as pontas dos seus dedos haviam sido decepadas..
– Acabou tudo – pensou em pânico.
Foi socorrido e no hospital recebeu a notícia que tinha perdido as pontas dos dedos da mão direita e quebrado alguns ossinhos, que foram logo retirados e que não daria mais para serem reconstituídos.
– Mas dará para voltar a tocar guitarra? – perguntou aflito, ainda esperançoso de embarcar para a turnê com a banda.
– Não – disse o médico.
O sonho de fazer o que gostava e ainda ser pago por isso, que era tocar guitarra numa banda, mal havia começado e logo acabara de uma forma triste e precipitada.
Sua mãe, sentindo-se culpada por tê-lo mandado de volta para a fábrica, ficou ainda mais arrasada que ele.
Triste, recuperando-se em casa, algum tempo depois recebeu de presente do antigo gerente da fábrica um disco do guitarrista Jean “Django” Reinhardt.
– Que presente de grego – pensou, pois a última coisa que um guitarrista recém aposentado queria ouvir era um disco de outro guitarrista.
Mas no final acabou ouvindo.
– E então? Gostou? – perguntou-lhe o antigo gerente.
– É legal sim – disse.
– Ele também também teve um sério problema na mão e conseguiu voltar a tocar. E se você acha que ele toca bem, você também pode conseguir voltar a tocar.
Aquilo lhe acendeu uma luz.
Foi o ânimo e a inspiração que aquele jovem precisava escutar naquele momento.
Ainda tentou com vários médicos diferentes alguma alternativa, mas todos disseram que era impossível.
Ele, então, começou a criar as próprias falanges para os dedos que estavam em falta usando plástico, borrachas e fazendo soldas, como tinha aprendido na fábrica.
Num processo de tentativa e erro, agindo como um cirurgião plástico de si mesmo, foi testando os encaixes e tocando a guitarra para ver se funcionava.
Mas só quando teve a ideia de usar tiras de couro amarradas nos encaixes de plástico para que as cordas tivessem aderência aos seus dedos, tudo funcionou.
Apesar da dor e do incômodo, ele voltou a tocar com confiança.
E persistiu por muito tempo, tocando não só de um novo jeito que respeitava esta sua limitação, como principalmente para que a sua grande paixão – tocar guitarra – continuasse viva.
E, felizmente, ele continuou e perseverou.
Algum tempo depois, Anthony já tinha conseguido voltar a tocar em algumas bandas locais.
Mas quando, junto com o baterista Bill Ward, chamou o antigo companheiro de escola Ozzy Osbourne e o Geezer Butler para formarem uma nova banda, o mundo da música seria transformado para sempre.
Nascia assim o Black Sabbath, uma das bandas mais importantes e cultuadas da história, e que inventou o som que ficou conhecido como Heavy Metal.
Nascia assim a lenda viva Tony Iommi, um dos maiores e mais influentes guitarristas de todos os tempos, dono de um estilo inconfundível, marcante e icônico.
E tudo isso porque ele só queria continuar tocando guitarra quando quase todos ao seu redor tinham certeza que ele jamais conseguiria.
E também porque o antigo gerente teve a sensibilidade de lhe dar aquele disco, que acabou sendo a luz no fim do túnel que lhe mostrou uma saída que poderia ser seguida – e ele, com muita determinação, seguiu.
Afinal, muitas vezes o que achamos que é o fundo do poço, na verdade é só o fim de um ciclo e o início de um futuro diferente e mais bonito.
Mas isto só iremos descobrir se continuarmos no caminho e não duvidarmos da nossa capacidade de reinvenção, né? 😉
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