Por Eduardo M. R. Lopes
É chover no molhado dizer que no mercado extremamente competitivo em que vivemos, manter-se atualizado é fundamental para auxiliar na sobrevivência dentro e fora do mundo corporativo.
E é curioso perceber que várias das habilidades ou características comportamentais mais valorizadas pelas empresas hoje são justamente algumas daquelas que todos tínhamos quando éramos crianças.
Entretanto, seja pelo tipo de educação, (falta de) estímulos, bloqueios e outras “n” razões que apareceram ao longo do caminho, algumas delas perderam a força ou desapareceram com o passar do tempo.
E agora os adultos precisam correr atrás para reaprendê-las e recuperar aquela mentalidade infantil que já vinha instalada de fábrica, com a vantagem dos upgrades que a experiência pelos anos vividos deveria trazer a reboque.
E qual é a melhor forma para reaprendê-las?
– Fazendo cursos, né?
Sim, esta é a resposta óbvia.
Entretanto, há uma resposta não óbvia e que complementa a anterior, mas que muitos na correria do dia a dia às vezes ignoram repetidas vezes – especialmente os que já são pais e mães.
Brincar com os filhos e/ou com as crianças.
– Espera aí, isso é pegadinha, né? Você não tem noção da pressão e o quanto de trabalho tenho que fazer para vir com esse papinho de que brincar com uma criança irá me tornar um profissional melhor?
Pois é, não só te tornará um profissional melhor hoje como aumentará a probabilidade dos pequenos tornarem-se profissionais melhores quando crescerem.
– Parei contigo.
Sem problemas, mas não deveria.
Vejamos.
Brincar, mas brincar de verdade, presente e não “para cumprir tabela”, além de ser um momento único de diversão em família, ainda possui três vantagens adicionais:
– É uma experiência onde você ensina e aprende ao mesmo tempo, reconectando-se ao que era e passando a enxergar a vida com um novo olhar;
– Está construindo uma base emocional mais sólida e repleta de momentos felizes que farão a diferença na sua vida e na dos seus filhos;
– A percepção na prática de várias características positivas dos pequenos, permitindo assim atuar o quanto antes como um agente incentivador ao invés do inibidor que irá bloqueá-las no meio do caminho.
E assim, além de crescermos exercitando ao lado deles estas características, estaremos ajudando a formar adultos mais fortes e emocionalmente mais preparados para navegar num futuro ainda mais incerto e desafiador.
Um verdadeiro ganha-ganha para todos em todas as esferas – hoje, amanhã e depois.
Desta forma, dando continuidade ao que havia inicialmente explorado no artigo As lições que as crianças ensinam e porque os adultos não aprendem e nesta palestra, trago aqui 9 habilidades e características importantes que elas já possuem e que precisamos preservar (e aperfeiçoar) em todos nós.
1- Criatividade para resolver problemas
A criatividade é uma habilidade que está relacionada na criação de coisas para resolver algum tipo de problema.
E as crianças, por incrível que pareça, possuem vários “problemas” no seu dia a dia – principalmente com relação às brincadeiras, pois elas precisam se divertir todos os dias, mas a quantidade de brinquedos nunca aumentará na mesma proporção.
(E nem deveria, caso contrário o efeito será o reverso, pois com o costume de ter tudo a mão, a criança vai se acomodando com as soluções prontas, a criatividade vai se perdendo e a dificuldade em trabalhar com incertezas será maior).
A solução, então, é procurar soluções criativas (às vezes geniais) o tempo todo e isto está diretamente relacionado ao: tamanho e variedade do repertório de conhecimento acumulado, liberdade para experimentar, tentar e errar, e foco.
Liberdade para experimentar elas já têm (ou deveriam ter) e por isso são verdadeiras máquinas de tentativa e erro até conseguirem fazer o que pretendiam.
Foco também, pois se a brincadeira é montar um castelo, tudo no quarto (e sala, cozinha, etc.) passará a ser encarado como uma peça potencial na montagem desse castelo.
O repertório é que ainda está bem no início da formação, mas isso é compensado usando e abusando da imaginação para tentar fazer a conexão entre os pontos (lembra do discurso do Steve Jobs?) e resolverem esses problemas.
E hoje o que as empresas mais querem não são os tais “problem solvers”?
2- Sempre prontas para aproveitar qualquer oportunidade
Pergunte para uma criança se ela quer ir agora para a Lua e ela lhe dirá que sim.
Pergunte se precisa levar alguma coisa e é provável que ela diga que só precisa pegar o brinquedo XYZ, pois esse brinquedo sempre sonhou em ir para lá também.
Mesmo não entendendo com clareza a dimensão do que está à sua frente, ela poderá até sentir medo, mas não deixará passar uma oportunidade que considere interessante por conta disso.
Afinal, a sua curiosidade acaba sempre falando mais alto e a impulsiona direto para a ação.
E ela vai.
Ao contrário de muitos adultos, onde o medo muitas vezes é quem fala mais alto, e tudo acaba permanecendo como está.
3- Curiosidade como estilo de vida
De uma forma geral, elas são pesquisadoras natas que, por instinto, parecem nascer já sabendo a metodologia de pesquisa científica e não param de aplicá-la.
Primeiro observam, depois perguntam, perguntam, perguntam, perguntam, perguntam e então começam a formular suas primeiras hipóteses.
A partir daí fazem os testes (e comparações), analisam os resultados e logo em seguida confirmam essas hipóteses ou então criam novas – e aí começam a fazer tudo de novo.
Vale para qualquer assunto, exceto brinquedos.
Afinal, se estiverem com um nas mãos, aparentemente esta é a única ocasião em que não há a fase dos “por que?”.
Elas vão da observação direto para a ação e já concluem as suas teorias. 😊
E, o que é mais legal, é que mesmo que elas já tenham certeza sobre alguma coisa, pode apostar que elas voltarão a tocar nesse assunto depois de um certo tempo.
Só que agora com novas perguntas e com pessoas diferentes para verificarem se o que achavam que sabiam ainda é o que deveriam, de fato, saber.
4- O olhar do aprendiz pronto para aprender e ensinar
Quanto maior for a curiosidade sobre algo, maior será o gosto da descoberta por aquele aprendizado.
E, quanto mais elas aprendem, mais elas irão querer continuar aprendendo sobre determinados assuntos – e falando sobre eles.
Não é à toa que as crianças que gostam de dinossauros, por exemplo, costumam dizer até o nome científico completo de uma dezena deles e ainda os diferenciam sem pestanejar.
E, se você lhes perguntar algo, não hesitarão em lhe contar todos os detalhes pelo tempo que for necessário.
Elas aprendem e ensinam o tempo todo, desde que haja o estímulo, é claro.
E até mesmo quando elas acham que já sabem tudo, basta você apresentar um elemento novo que elas pararão para ouvir como se estivessem sendo apresentadas ao assunto como da primeira vez.
E, se pararmos para pensar, tudo é uma primeira vez, né?
Assim também como não terão nenhum problema para abandonarem suas “certezas”, caso entendam que a novidade faça mais sentido.
5- O novo é um desafio a ser experimentado
Se quiser ver uma criança com um sorriso nos lábios e no olhar, basta mencionar a palavra NOVO perto dela – seja em referência a um brinquedo, um parque, uma brincadeira, um livro, um desenho ou um lugar, por exemplo.
É impressionante como praticamente tudo o que seja novo as atrai.
Mesmo que algumas não sejam tão rápidas a agir quanto outras diante do que seja a tal novidade, todas vão querer experimentar.
E, diferente de grande parte dos adultos, a partir daí é que irão começar a formar sua própria opinião.
Lembra da curiosidade ser maior que o medo?
Pois é.
6- As mudanças fazem parte do jogo
O mesmo acontece quando estão brincando em grupo e alguma criança propõe uma brincadeira diferente, ou apenas queira fazer algo diferente dentro da mesma brincadeira.
A não ser que essa sugestão seja tomar o brinquedo de uma outra criança, alguma logo dará uma nova sugestão e uma discussão começará.
Mas tão rápido quanto começa, rapidamente já acaba e, em segundos, todas estarão brincando dentro da nova proposta ou o grupo se dividirá com novas brincadeiras.
Afinal, mesmo que uma outra fique contrariada, não há tempo a perder e, se não der para continuar brincando de um jeito, brinca-se de outro e tudo bem.
Praticamente todas as brincadeiras mudam o tempo todo e, muitas vezes, num ritmo frenético, mas elas logo se adaptam e vida que segue.
7- A Imaginação como caminho para a Simplicidade
Nessas brincadeiras, aliás, as crianças costumam fazer uso do que está a mão.
Elas não deixam de brincar se faltar algo e nem perderão tempo pensando nos brinquedos e coisas maravilhosas que elas poderiam usar para fazer as brincadeiras ficarem ainda melhores, simplesmente porque não há esta opção.
E, se não há esta opção, o que faltar logo será substituído pela imaginação para recriar cenários, história e adaptar as coisas.
É quando um cavalo poderá virar um dragão, um tambor poderá virar um caldeirão, uma meia poderá virar uma ponte e está tudo certo.
Como o mais importante é que a brincadeira siga em frente, simplificar para resolver o problema é preciso.
Então elas vão lá e brincam com o que há, da melhor forma possível, enquanto não é possível ter coisas melhores para brincarem ainda melhor.
Simples assim.
8- Acabativa
Ao contrário de muitos adultos, que costumam iniciar dezenas de projetos e concluem alguns poucos, as crianças conseguem concluir praticamente todos os projetos em que se metem.
Dê qualquer coisa para uma criança montar ou pintar e, se ela se identificar com aquilo, ela irá fazê-lo até o final.
E isto independe de estar certo ou errado ou não ter pé nem cabeça segundo os padrões dos adultos.
O foco é fazer e terminar (na maioria das vezes) agora.
9- Vivem o momento presente
Para as crianças não existe o amanhã, então elas querem brincar de tudo o que puderem agora e aproveitam cada instante como se fosse o último.
Quando estão brincando, estão brincando de verdade, presentes, e não pensando nos trabalhos do escola ou na bagunça que precisarão arrumar depois.
Tudo é intenso (e desesperador) porque tudo é para já, que é o único tempo que elas entendem.
E, no dia seguinte, tudo se repete, vivendo cada instante de cada vez.
E isso acaba trazendo de bônus outro item importante: a persistência.
Se o tempo delas é o “agora”, elas não sossegam e nem desistem enquanto alguma promessa não for logo cumprida, ou então não conseguirem fazer as coisas que elas querem nesse “agora”.
E aí é onde o bônus da persistência poderá virar um grande pesadelo.
Afinal, se os pais costumam fazer tudo o que os filhos querem e no tempo em que eles querem, estarão contribuindo para formar um adulto egoísta e pouco resiliente, que terá muitas dificuldades em se adaptar às mudanças e em superar as diversas frustrações que irão aparecer no caminho.
Moral da história
Todas essas características estão, direta ou indiretamente, ligadas a uma das habilidades mais importantes hoje em dia: criatividade.
Por isso nunca subestime o contato com uma criança, que além de ser a criatividade em estado puro, também é uma grande professora.
E pouco importa se ela não consegue dizer exatamente o que fazer, que é como a maioria dos adultos parecem gostar de aprender: seguindo comandos ao invés de construir suas próprias respostas.
Afinal, pensar cansa, assim como educar cansa ainda mais.
Mas só aprendemos de verdade quando nos conectamos.
E só nos conectamos quando estamos presentes.
E, quando estamos presentes, conseguimos ver o mundo através dos olhinhos delas.
E então percebemos que quase tudo na vida é empatia e conexão (ou reconexão).
É aí onde o aprendizado floresce e onde mora a nossa verdadeira força criadora e criativa. 😉
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