Imagine que você acabou de se mudar para um novo apartamento e, volta e meia, tem cruzado com um vizinho cabeludo que só anda de roupa preta para lá e para cá.
Aí você ouve os amigos dele chamando-o pelo singelo apelido de Moedor de Cadáveres e descobre que ele é músico, e que até canta numa banda rock.
Pesquisa na internet e não é bem aquele rock tradicional, mas sim um tal de death metal, que é um gênero bastante sinistro e agressivo, com letras macabras e violentíssimas.
Começa a ficar nauseada quando decifra o nome da banda e depois começa a sentir calafrios quando olha as capas dos discos que eles lançaram.
E, por sinal, foram muitos – inclusive acabaram de lançar mais um em 2021.
Desliga o computador aterrorizada imaginando que tipo de letras eles escreveriam e então a ficha cai: afinal, que tipo de sujeito é este que mora ao meu lado?
– Será que ele participa de rituais macabros ou… será que ele é um serial killer?
Sua cabeça entra em parafuso imaginando as piores coisas possíveis e então corre até a cozinha para beber água.
Ainda nervosa, resolve chamar os filhos para irem brincar no parquinho em frente de casa para dar uma espairecida e tomar um pouco de ar fresco.
Chegam lá e encontram duas meninas sorridentes brincando com alguns bichinhos de pelúcia.
É óbvio que seus filhos correm logo para brincar com elas e, num piscar de olhos, você também já está no meio deles rindo e fazendo a festa.
– Esses bichinhos de pelúcia são lindos, meninas! – você diz.
– Há sempre muitos lá em casa – responde uma delas.
– Sério? Seus pais trabalham com brinquedos?
– Não, meu pai é que, sempre quando vê aquelas máquinas de garras nos shoppings, vai lá e consegue pegar vários bichinhos. E ele é muito bom nisso! – diz a filha orgulhosa.
– Nossa, deve ser bom mesmo. Fico imaginando que vocês devem ter um quarto só para isso, né?
– Na verdade não, pois a maioria desses bichinhos são para doação.
– Doação?
– Sim, a maioria do que ele consegue pegar levamos para a escola, onde são vendidos para ajudar em projetos sociais do nosso bairro. Alguns ficam conosco e outros damos para outras crianças brincarem. E você pode ficar com este se quiser, tá bom?
Aqueles olhinhos sorridentes da menina com a pelúcia nas mãos, oferecendo-te, quebram o teu coração.
E, mesmo querendo recusar por educação, você não consegue.
Então, pega o bichinho de pelúcia, abraça-o e sorri agradecida, disfarçando a lágrima que ameaça cair.
– Obrigado. Você é um amor e seu pais devem ser pessoas incríveis. Aliás, cadê eles? Eles deixam vocês brincarem sozinhas aqui no parquinho?
– Não, o meu pai é aquele de camisa preta ali do outro lado falando ao celular. Olha lá!
A menina começa a pular e acenar para o pai, que repara na movimentação e, mesmo ainda falando ao telefone, sorri e acena de volta.
Seu coração dispara, sente um nó na garganta, os músculos congelam e você nem percebe que a pelúcia caiu no chão.
Lá está o George Fisher, vulgo Corpsegrinder, vocalista do Cannibal Corpse e “campeão mundial” de ganhar bichinhos de pelúcia em máquinas de garras.
E, então, o que você faria?
Pois é.
Julgamentos.
Independente do trabalho que você esteja fazendo ou queira fazer, provavelmente ele não deve ser nada “sinistro” quanto o trabalho que o George e seus companheiros vem mostrando pelos palcos do mundo desde 1988 – e que os transformaram na banda de death metal de maior sucesso comercial da história.
Mas uma coisa é certa: a grande maioria das pessoas que não fazem parte do público-alvo do trabalho dele – e do seu também – talvez nunca entenda direito, mas certamente continuará julgando a partir de uma pequena parte daquilo que é visto.
Seja os bichinhos de pelúcia ou seja as músicas sobre a morte.
O que realmente importa é se conectar com as pessoas que estão interessadas naquilo que você sabe fazer de melhor, pois os julgamentos continuarão existindo independente da sua vontade.
E, cá entre nós, se o George não está preocupado com isto, por quê eu e você deveríamos estar?
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